Segundo Jorge Gonçalves Filho, as faixas de menor poder aquisitivo seriam as mais prejudicadas com o fim das compras parceladas
Dois assuntos dominaram as discussões sobre o comércio brasileiro em 2023: a competição com os marketplaces internacionais, especialmente os da China, e o parcelamento das compras com cartão de crédito.
No primeiro caso, os varejistas alegam que não competem em condições de igualdade com os marketplaces de fora, que até este ano, na prática, não pagavam nenhum tipo de taxa para vender seus produtos no Brasil — os lojistas brasileiros, por sua vez, pagam mais de 110% de taxas.
Na segunda situação, os lojistas foram surpreendidos com a sugestão feita pelo Banco Central de diminuir o número de parcelas e aplicar juros em compras no cartão de crédito, acabando com uma facilidade que muitos brasileiros — especialmente os com renda mais baixa — se acostumaram a usar, principalmente na hora de comprar produtos de maior valor.
Ao longo do ano, os dois assuntos foram acompanhados de perto por Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo), que também tem levado as preocupações do setor ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e outros representantes públicos. Como resultado dessas conversas, o governo criou o Remessa Conforme, que prevê a cobrança de ICMS para compras internacionais abaixo de US$ 50 (cerca de R$ 245, pela cotação atual). A seguir, Gonçalves fala sobre os desafios de lojistas e compradores neste ano.
Cerca de 50% do valor das compras com cartão de crédito são feitas com o parcelamento sem juros [no cartão]. Não há como ficar sem o parcelado sem juros, não vemos forma de acontecer isto a médio prazo. Seria altamente prejudicial ao varejo e aos serviços e à população, especialmente os mais pobres. Sabemos que quanto maior o valor, maior a dependência do parcelamento no cartão de crédito. A parcela precisa caber no bolso do consumidor.
Temos participado das discussões na busca por uma solução que atenda ao sistema financeiro, às empresas das maquininhas, às fintechs, aos setores do varejo e de serviços e, principalmente, que não prejudique a oferta de crédito ao consumo, em especial para as faixas de menor poder aquisitivo. Sempre que existe algo exacerbado, como o elevado nível de juros que estavam sendo cobrados [no cartão de crédito], a sociedade tende a reagir. Achar a solução é um grande desafio, não só para o Banco Central como para todos os envolvidos.
O assunto, provavelmente, será solucionado por partes. Quando se deu início às análises da causa do elevado nível dos juros no rotativo do cartão de crédito, várias outras questões surgiram, agora terão que ser atacadas. Iniciativas que fomentam o aumento da concorrência e o livre mercado seriam as melhores.